segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Doença de Alzheimer Memória Roubada

Cuidadores fazem a diferença na atenção ao doente
Lucita Briza

Uma das perspectivas de futuro mais animadoras é saber que hoje em dia as pessoas estão vivendo mais. Por trás dessa constatação, porém, dúvidas nos afligem e, uma das maiores é se poderemos envelhecer mantendo nossa integridade mental, sem apresentar quadros de demência - esse grupo de doenças que afetam o cébrebro, levando a um progressivo prejuízo de suas funções. Entre elas, a Doença de Alzheimer (DA), é a mais temida, pois representa 50% a 70% dos casos. 

Essa aflição começou a martelar a cabeça de A.F. há 17 anos, qua\ndo sua mulher Y começou a apresentar estranhos comportamentos: embaralhava idéias, parecia distante ou não entendia o tema das conversas, irritando-se com isso. Levou-a então a um psicólogo, depois a vários neurologistas e psiquiatras e cada vez mais parecia haver uma base física para esses problemas. Os exames se repetiam - mesmo porque, explica A.F., a Doença de Alzheimer não se detecta de um dia para o outro. 

Enquanto a Ciência discute a viabilidade da reposião das células nervosas ou neurônios ( a DA é uma forma de degeneração do sistema nervoso central), a geriatra Márcia Oka, do Hospital Santa Catarina (SP), confirma que a moléstia se inicia de modo incidioso. Em geral, ela é associada à perda de memória, mas nem sempre essa perda é devida À DA.

A perda da memória recente foi uma das primeiras dificuldades apresentadas por Y (não reconhecia ou confundia o nome das pessoas); em seguida, veio a perda de orientação espacial (perdia-se ao sair sozinha, desorientava-se dentro de casa) e temporal (perdeu noção de hora, dia, mês e ano). Esses fatos contaram a favor de um diagnóstico positivo para a doença, mas não sua idade: Y estava ao redor dos 55 anos e o quadro é mais frequente após os 65 anos. "A partir dos 85 anos, pode´se dizer que metade das pessoas tem Alzheimer - o que não é uma fatalidade biológica, já que a outra metade não tem", observa o neurologista Paulo Bertolucci, livre-docente da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo.

O caso de Y correspondia à descrição que Bertolucci faz da D.A.: uma alteração progressiva da cognição, acompanhada de alterações comportamentais com uma contínua dependência do paciente nas atividades do dia a dia. Ela começou a atrapalhar-se nas compras, nos telefonemas ou para esquentar comida. Depois ficou incapaz de escolher sua roupa, tomar banho, escovar os dentes. Na fase terminal, já incapaz de se comunicar e de alimentar-se sozinha, permanecia deitada e sem controle esfincteriano. 

Y sempre foi dócil, mas a D.A. pode provocar alteraçoes de comportamento como depressão, agitação e agressividade, além de atos repetitivos, como andar de um lado par o outro ou repetir o mesmo som, incomodando quem está em torno. Por todas essas razões, dia a geriatra Márcia, a D.A. envolve família e amigos do doente, que precisam ser orientados para colaborar. 

Não há prevenção total para a D.A., embora hoje exista maior percepção sobre este mal. Sua causa continua desconhecida: sabe-se que os neurônios morrem pelo acúmulo de proteínas não normalmente encontradas no cérebro, tanto dentro (a proteína tau) como fora dos neurônios (a proteína beta-amiloide) - mas não se sabe porque se inicia este processo - e que a D.A. envolve um fator genético (quem tem pai ou máe com a doença tem maior chance de desenvolvê-la, mas isto não significa que apresentará D.A.). Entre os fatores de risco já conhecidos estão: pouca atividade física, reduzida atividade intelectual, baixa escolaridade, tabagismo, envelhecimento, diabetes e/ou hipertensão e obesidade começando na meia-idade (entre 50 e 65 anos).

Se uma pessoa tiver problemas de memória e procurar ajuda médica, caso seja portadora de D.A. terá maior chance de controlar precocemente a doença, adiando por mais 10 ou 15 anos o surgimento de boa parte dos sintomas. Já quando um paciente não dá sinais de perceber suas dificuldades, ou parte delas, o médico terá que dar mais peso ao que seu acompanhante diz. A discrepância entre os dois discursos serve de alerta de que o caso pode ser de demência - e a D.A. é a mais provável delas. 

Para o diagnóstico, a avaliação clínica é fundamental: o médico realiza exames de memoria, linguagem, avalia a capacidade de planejamento e abstração e, em caso de dúvida, pede uma tomografia ou a ressonância magnética. Não há exame específico que comprove a D.A. - a não ser nos raríssimos casos de Alzheimer familiar, que podem ser constatados em um exame genético. 

Como não existe tratamento curativo para a D.A., o que há são drogas que retardam os sintomas da doença, como os inibidores da acetil-colinesterase - remédios caros, mas disponíveis  na rede pública de saúde. Também é importante o tratamento não farmacológico, envolvendo profissionais como fisioterapeuta, fonoaudiólogo, etc. 

Fechado o diagnóstico de Y, A.F. concluiu que o melhor a fazer era "dar a ela uma boa qualidade de vida. Foi o que tentei, durante 15 anos (até Y falecer em 2010). Fez um curso de cuidador4 e assumiu totalmente a função administrando os remédios, cuidando da higiene pessoal e da alimentação de Y. Já aposentado, continuou trabalhando duas horas por dia - quando era substituído por um dos auxiliares que encaminhou para o mesmo curso que havia feito na Associação Brasileira de Alzheimer (www.abraz.com.br).
Em 80% dos casos, os cuidadores são familiares dos pacientes, diz Vera Caovilla, presidente da seccional da ABRAz em São Paulo, que também cuidou de seu pai com D.A. Como consultora da área de saúde, Vera viu a importância de formar esses cuidadores - que precisam de orientação e também de cuidados para enfrentar o desgaste e os sentimentos de (tristeza e raiva à impotência) que a função provoca. Tanto a ABRAz como a APAz (www.alz.org), sediada no Rio de Janeiro, organizam grupos de apoio a famílias e cuidadores de pacientes de D.A..